Por José Rezende
No início de 1950, a imprensa de todo Brasil, especialmente a carioca, noticiava a transação mais cara no futebol brasileiro. Após vestir durante 11 anos a camisa do Flamengo, o extraordinário Zizinho, o “Mestre Ziza”, como o chamava o famoso locutor esportivo Oduvaldo Cozzi, era comprado pelo Bangu por 800 000 cruzeiros. Zizinho, ainda magoado, desabafou:
“Eu um dia eu estava na minha casa e recebi um convite do Dr. Silveirinha para ir ao escritório dele. O convite tinha sido feito, através do meu cunhado, e eu relutei em atender, por se tratar de um diretor de outro clube. Mas, atendendo o apelo do meu cunhado fui até lá. Quando cheguei, ele virou-se para mim e disse que o Bangu havia negociado meu passe com o Flamengo. Perguntou, em seguida, se eu gostaria de jogar no Bangu. Olhei para o Silveirinha e achei estranhas as palavras dele, porque eu não sabia nada daquilo. Ele sentiu que eu não estava acreditando e, então, pegou o telefone e ligou para o Dario de Melo Pinto, presidente do Flamengo, que confirmou pelo telefone. O Dr. Silveirinha me perguntou se agora eu acreditava ou não. Eu respondi que botasse o contrato ali para eu assinar.
Quando eu quebrei a perna, joguei todo um campeonato no Flamengo, com o tornozelo enfaixado. Eu tirava após os jogos a bota de esparadrapo e meu tornozelo ficava enorme. Eu passava a semana toda sem treinar e no domingo jogava. Quando eu quebrei a perna, descobriram que eu tinha uma fratura no tornozelo e passei um ano jogando assim, sem saber. A fratura já tinha consolidado e só vim saber quando tiraram a radiografia da minha perna quebrada. Eu me sacrifiquei demais pelo Flamengo. Eu lembro que joguei uma partida e ganhei um “Oscar” do Jornal dos Sports. Havia comido caranguejo naquela semana e fiquei todo inchado. Cheguei ao Flamengo e fui jogar o Fla x Flu.
Até hoje, que eu saiba, não havia razão para que eu fosse negociado dessa forma. Quem sabe bem essa história é o Luís Carlos Barreto.
Apesar de nada impor, porque minha mágoa era muito grande, a minha ida para o Bangu foi financeiramente vantajosa. Um jornal deu uma quantia astronômica para a época. O Silveirinha me chamou e perguntou se eu aceitava o que o jornal publicou. Eu respondi que ele não tinha compromisso com a imprensa e nem foi dito por mim. Eu aceitei o que não tinha coragem de pedir. Deixei claro que assinaria em branco, porque estava muito magoado com o Flamengo”.
A seleção brasileira preparava-se para a Copa do Mundo e disputava a Copa Rio Branco com os uruguaios e a Taça Osvaldo Cruz com os paraguaios. A estréia no seu novo clube só aconteceu depois do mundial.
Zizinho não participou das duas primeiras partidas do Brasil, contra o México (4 a 0), no Maracanã, e frente aos suíços (2 a 2), no Pacaembu. A Iugoslávia era o próximo adversário. Quem vencesse se classificaria para a fase final:
“Eu tive uma torção no joelho e não pude jogar as duas partidas iniciais do mundial. Fiz um teste na véspera do jogo contra a Iugoslávia, que era um jogo que eliminaria a gente, caso não ganhasse. Na véspera, estava me arrastando, mas o Flávio me obrigou a jogar. Eu lembro que passei a noite quase em claro. Os medicamentos naquela época eram poucos e me colocaram um remédio que se usava no Jóquei Clube. Aquele negócio me queimava tanto, que eu levantei de noite e entrei no chuveiro, no campo do Vasco, para lavar meu joelho”.
Após a difícil vitória diante dos iugoslavos, vieram as goleadas de 7 a 1 e 6 a 1, nos suecos e nos espanhóis. A euforia tomou conta da torcida, dos dirigentes e da imprensa. Os políticos, era época de eleição, aproveitavam a ocasião para aparecer. “Mestre Ziza” com a experiência de quem conhece as armadilhas da vida e as surpresas do futebol, sabia que a partida final seria difícil:
“Vocês da imprensa, também, tiveram um pouco de culpa, porque foram montadas fotografias, com faixas do Brasil campeão do mundo. Na véspera do jogo,nós passamos o dia todo, assinando milhares de fotografias, sem termos um minuto de descanso. Houve descontração para uma partida de futebol, em São Januário. O Vasco não teve culpa de nada. A culpa foi de quem nos tirou do Joá.
Num momento eu comentei com o Rui, parece que nós já ganhamos o título. Vamos ter um adversário difícil. Não é contra uma seleção da Europa. É contra os uruguaios e eles conhecem demais a gente”.
Zizinho não conseguiu o título tão desejado. Sua brilhante trajetória no futebol bem que merecia. Mas, com toda justiça, já como jogador do Bangu, foi eleito o craque da Copa do Mundo de l950.
- Zizinho embarca com seus companheiros para Araxá, primeira concentração brasileira antes da Copa de 50. A partir da esquerda, Dr. Nilton Paes Barreto, Alfredo, ambos de chapéu, Adãozinho, Barbosa, Maneca, Zizinho, Pinga, Ademir, Tesourinha, Nena e Mário Américo.
- Zizinho investe contra a meta iugoslava.
- Após marcar seu gol contra a Iugoslávia, Zizinho, com a bola embaixo do braço, festeja com Chico, Ademir e Maneca.
- Na final diante do Uruguai, Zizinho chuta, Máspoli tenta a defesa e a bola passa rente a trave.
- Mestre Ziza se apresentou ao seu novo clube após a Copa do Mundo. No primeiro treino, ele veste pela primeira vez a camisa do Bangu. Brasil nos Jogos Olímpicos A partir de agosto, a um ano da abertura das Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro, iniciaremos a série “Brasil nos Jogos Olímpicos”. Serão lembrados os momentos marcantes da participação brasileira na história das olimpíadas.